sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

O óbito


Aquela faca cortou fundo...
Ele sentiu a dor depois que o vermelho tomou conta do tapete e o interessante é que não ouvia nada. As cenas se passavam, homens fardados corriam de um canto a outro carregando algumas ferramentas que pareciam ser instrumentos médicos. Até que um deles se aproximou, pegou no pulso direito e tentou impedir que o sangramento prosseguisse, mas ele já havia perdido muito sangue e desmaiou.
Algumas horas depois quando acordou, viu uma luz forte e branca, olhou para os lados e concluiu que estava um leito de hospital. Não enxergava direito, não ouvia muito bem nem tampouco sentia seus membros. Uma mulher, não muito atraente, trouxe alimento e alguns comprimidos, ele preferiu os comprimidos, a comida estava com uma cara péssima e um cheiro horrível, sem falar que Márcio odeia fígado.
Até que entra outra mulher (essa sim era atraente) e deu-lhe um beijo na boca que deve ter durado uns cinco segundos, talvez mais. Márcio virou o rosto em forma de protesto. Não queria ver ninguém, muito menos Marina, sua noiva. Eles haviam brigado feio, tudo por causa de um mal entendido que fora causado quando Marina viu Márcio se despedindo de uma amiga da faculdade, a amiga havia lhe beijado a boca acidentalmente na despedida e Marina viu.
Os planos de vingança fluíam paulatinamente na cabeça de Marina.
Ela se arrependeu de ter acusado o noivo daquela forma tão veemente e chorou durante alguns minutos ao pé da cama onde estava Márcio. Uma enfermeira tentou oferecer algum consolo e conseguiu retirá-la do quarto. Os cigarros, o wisque, a tv, a família, nada nem ninguém finalizava a aflição que assolava Marina, e que também assolava, a essa altura, a família do rapaz, os amigos mais próximos, companheiros de trabalho e de faculdade. A essa altura, quase uma multidão preenchia a porta e os corredores daquele hospital localizado no centro de São Paulo. Tamanha movimentação trouxe ao local também, nada mais que a imprensa, a grande imprensa, os primeiros repórteres a chegar foram os da Folha de São Paulo, pouco a pouco, O Globo, O Estadão, O Estado de São Paulo e Jornal do Brasil tinham no local seus representantes. O motivo pelo qual tantos jornalistas estavam presentes podia ser agora ouvido pelo noticiário da Tv: “Um enorme grupo de jovens está concentrado na entrada e nos corredores do Hospital Regional de São Paulo, tudo para que todos possam visitar o amigo Marcos Brandão Nunes de 23 anos, estudante de direito da USP, que teria cometido uma tentativa de suicídio logo após discutir com a noiva Marina Morena Escalante de 22 anos. Os jovens, na boa intenção de visitar o Marcos, acabaram congestionando dois corredores do hospital e conseqüentemente atrapalham, neste exato momento, o trabalho dos médicos que tentam socorrer oito vítimas de um acidente automobilístico que ocorreu há aproximadamente 20 minutos na Via Dutra.
Mas infelizmente os médicos que cuidam do caso de Marcos acabaram de informar que o jovem não resistiu e foi à óbito.
Pode-se observar uma cena curiosa na entrada e corredor central do hospital: os jovens estão cantando a música I’am outta time da banda britânca Oásis em homenagem ao jovem que acabou de falecer.
É uma cena marcante! Vozes e lágrimas se misturam e ecoam pelos corredores do hospital num tom de inconformidade com o fato. Os jovens cantam toda a letra enquanto se abraçam e choram copiosamente. É mais uma cena chocante que anunciamos com grande pesar, mais uma vida que se foi.
Voltamos para os estúdios.

Amor em Cíanos


A cidade resplandecia em tons de azul com verossimidades de cíano de tão suave que era sua cor. Os amores uniam-se nos banquinhos branquinhos da praça bem iluminada. E o vendedor de rosas atendia à demanda.

Quando as mãos se uniam, concomitantemente a respiração aumentava e paulatinamente os batimentos do coração aumentavam. Os pensamentos dedicam-se a fabricar frasezinhas românticas e de impacto. E o amor aumentava. (Quanta redundância!)

Pode-se observar de longe os coraçoezinhos vermelhos flutuando por entre os pares de rostos apaixonados. A essa altura o cupido já está gastando quase que a última de suas infalíveis flechas na praça que fica no bairro ao lado.

Até que ela vence pela insistência, a primeira gota de lágrima não pode ser contida, e as posteriores também não. Ele a consola com um abraço, daqueles que lhe envolve a dor e toma para si. Ela se sente melhor, mas apenas o abraço não é suficiente para mitigar a dor de Marina.

"São apenas dois meses, só mais dois meses". Marina sofria de câncer, lhe restavam apenas dois meses de vida, e isso lhe confrangia o coração, pois há três semanas conhecera Luciano - seu grande amor.

"Serão dois meses de intenso amor, tenha certeza!" Exclamou Luciano, que passou a passar as noites com Marina na inspiradora praça, rendendo-lhe discursos laudatórios e juras de amor. Porém, o tempo não lhes perdoara e cumpriu sua parte, passou e passou.

Luciano dedicava-se o dia todo a pensar na amada que partiria. Já não se concentrava mais no trabalho, as notas da faculdade caíram, também emagrecera cerca de oito quilos.

Marina já não pode mais ir à praça. Agora, a UTI lhe é abrigo, é também de Luciano, o qual não levanta dali um minuto sequer. Fica ao pé da cama observando-a pormenorizadamente. E beija-lhe de cinco em cinco minutos. Até que os médicos observam... e pedem que Luciano os deixem à sós com Marina. Este reluta, mas entende que é necessário. Luciano deixa a sala, mas espera na porta juntamente com a família da moça.

"Ehhh, infelizmente..." Luciano não espera o médico encerrar o veredicto e desesperadamente invade a sala aos prantos e abraça o corpo de Marina. Ninguém o tira dali. A não ser quando o corpo é recolhido para ser preparado para o velório.

Luciano não compareceu ao velório, nem ao enterro. Foi um pedido de Marina, que só queria a presença de Luciano enquanto ela estivesse presente. Em vida. O pedido de Marina foi respeitado pelo amado, que, agora, tenta (inutilmente) não pensar nos bancos brancos que outrora foram palco do maior amor vivido em todos os tempos.

...


Com o amor interrompido, assim Paulo sofreu, - O amor era tão sincero! (pensou) Como eu o perdi, deslizou como a água que não posso conter nas mãos, que agora estão secas e precisam de tua umidade meu amor. Mas que amor? Ele não havia sido interrompido?
É mesmo, (lembrou Paulo) tô viajando muito na maionese.
Paulo foi ao armário (ah, eram 9:47 da manhã) e lançou a mão no waffer de nozes, só que ele lembrou que "esse é o último daquela compra que eu fiz com..."
Foi à sua cadeira manjada de todas as manhãs, com o dedão do pé esquerdo ligou o estabilizador, com o dedão do pé direito ligou a cpu. E, como que de propósito, ninguém estava online no msn, e só havia recebido toneladas de vírus no Orkut (um palavrão lhe escapou pelos lábios). As esperanças também lhe escaparam, cabia ao waffer conferir-lhe uma última lembrança. Nesse dia ele não queria sair de casa, tentou proferir uma melodia mas o violão de cordas de aço de tensão pesada não mediava nenhuma emoção, só acordes. "Onde estão meus sentimentos?" (questionou Paulo)
Estavam todos ali, no waffer, que, por sinal, estavam próximos do fim (do pacote). A inquietude crescia, e o amor retornava ao seu lugar de origem, os waffers de nozes enfim realizavam sua missão aqui na terra!
Foi aí que Paulo recorreu àquela roupa, aquela bem bonita, e saiu pela porta à procura de Mônica, mulher com a qual fez sua última compra dos 37 pacotinhos de waffers de nozes.
O amor havia renascido!!!